quarta-feira, 9 de setembro de 2009

MULHER, POR QUE CHORAS?




O dia 8 de março é especialmente dedicado às mulheres. É uma homenagem mais do que justa pela grande contribuição que elas têm dentro da sociedade e pela sua capacidade de preservar a vida em cada canto do nosso planeta. O homem pós-moderno perdeu todos os seus referenciais diante da sociedade atual. Tornou-se um estranho dentro do seu próprio mundo. É um homem desarmado de valores consistentes e que tenham compromisso com a vida, com o outro, com natureza. Não consegue enxergar com os olhos da razão. É um homem fragmentado, dividido entre o bizarro e o trágico. Como um homem que se caracteriza por tais adjetivos, tem a capacidade de ver a mulher de outra maneira, senão de forma distorcida, das suas reais qualidades e importância?
Essa pergunta, que intitula esse texto, é bastante pertinente para atual situação da mulher brasileira. A sua realidade é bastante preocupante. Basta ver os noticiários jornalísticos e constatar que elas são alvo da brutalidade que vem ceifando suas vidas ao longo dos últimos anos no nosso país. “Só em Pernambuco 283 mulheres foram assassinadas em 2008. Desse total, 38,46% tiveram motivação passional”. E o pior é que a maioria desses crimes ficou em pune!

O Brasil, desde a sua formação, desenvolveu-se de acordo com os valores dos colonizadores portugueses onde o patriarcalismo era a regra que estruturava a sociedade lusitana. Nossa sociedade cresceu baseada nesses valores onde o homem tinha o total domínio sobre a mulher e a mesma lhe devia obediência. Suas vontades, desejos e individualismo não eram reconhecidos. Talvez seja em função disso, que muitos homens têm a mulher como uma propriedade, um objeto de prazer.
A mulher, atualmente no Brasil, é classificada, através de músicas, por nomes de frutas e animais irracionais. O erotismo e a sensualidade se tornaram os meios de se conquistar resultados positivos pelas grandes empresas que utilizam a propaganda para venderem seus produtos.

De onde vem essa submissão da mulher em relação ao homem e a sociedade?
Existem algumas explicações baseadas em costumes e tradições antigos e que podemos encontrar em textos reunidos em livros ditos “sagrados” como, por exemplo: A Bíblia.


Há várias passagens bíblicas onde a mulher é humilhada e tratada como um ser inferior aos homens. Veja o que encontramos: "Multiplicarei grandemente a dor da tua gestação; em dor darás à luz filhos; e o teu desejo será para o teu marido, e ele te dominará (Gen. 3:16). Veja outro exemplo: "Como, pois pode o homem ser justo diante de Deus, e como pode ser puro aquele que nasce da mulher?"(Ester 25:4). E que tal esse: "Porque os lábios da mulher silenciosa destilam mel, e sua boca é mais macia do que o azeite; mas o seu fim é amargoso como o absinto, agudo como a espada de dois gumes.” (Prov. 5:3-4). E esse absurdo aqui: "E eu achei uma coisa mais amarga do que a morte, a mulher cujo coração são laços e redes, e cujas mãos são grilhões; quem agradar a Deus escapará dela; mas o pecador virá a ser preso por ela.(Eclesiastes 7:26). Isso é uma pequena parte do que existe contra a mulher no Antigo Testamento. Veja o que dizem os evangelistas Marcos, (7:25); Lucas (16:18;18-29;20:8;24:11) e João (8:3;16:21) no Novo Testamento. Olha só as pérolas do apóstolo Paulo sobre a mulher: "Ora quanto às coisas de que me escrevestes, bom seria que o homem não tocasse em mulher” (Coríntios 7:1). E o próximo versículo é um convite a violência doméstica e sexual contra a mulher: "A mulher não tem autoridade sobre o seu próprio corpo, mas sim o seu marido.” (Coríntios 7:4). Leia também Coríntios (34:3;7-10). E o que dizer da mulher menstruada? O livro de Levítico dá a receita: (12:19) "Mas a mulher, quando tiver fluxo, e o fluxo na sua carne for sangue, ficará na sua impureza por sete dias,e qualquer que nela tocar será imundo até a tarde. 20 E tudo aquilo que ela se deitar durante a sua impureza, será imundo; e tudo sobre o que se sentar, será imundo(...). Em Gênesis (2:20-22 ) Deus forma a mulher das costelas de Adão. Isto foi necessário porque Adão não pode achar uma adjutora dentre os animais que Deus trouxe. Não seria mais prático e justo para Deus e digno para a mulher formá-la do mesmo material que deu origem ao homem? Com o erro de Eva (que foi castigada junto com todas as mulheres depois dela com as dores do parto), Adão também é castigado, embora menos severamente. Ele terá que trabalhar para viver, porque “destes ouvidos à voz de tua mulher”.Veja essa passagem aqui: Ló se recusa deixar dois anjos a mercê de um bando de pervertidos, e ao invés disso, ele oferece as duas filhas virgens. Ele diz para o grupo de estupradores: “fareis delas como bom for nos vossos olhos”. Este é o homem que é chamado de “justo” em (II Pedro 2:7-8);(19:8). Por olhar para trás, a esposa (sem nome) de Ló é transformada em uma estátua de sal por Deus.(19:26). Ló e suas filhas acampam durante algum tempo em uma caverna. As filhas aproveitam a bebedeira do pai e tem relações sexuais com ele, e cada uma concebe um filho. (19:30-38). Além dessas passagens bíblicas que desqualificam e submetem a mulher a uma condição humilhante, existem outras que sentenciam as mulheres a todo tipo de violência. Pessoas que se orientam por esses ensinamentos em pleno século XXI, encontram-se dominados por lavagem cerebral ou possui algum tipo de doença psiquiátrica.


Recentemente, no Brasil, a intolerância, a arrogância, a caça às bruxas contra as mulheres foi protagonizada pela ICAR. O ex-ascebispo de Olinda e Recife, D. José Cardoso, excomungou uma menina de nove anos de idade que foi violentada e estuprada desde os seis anos pelo padrasto, a mãe da garota, a equipe médica que realizou os procedimentos para que a menina abortasse e interrompesse uma gestação gemelar que certamente a levaria à morte. Se dependesse desse bispo, o “Tribunal da Santa Inquisição” seria ressuscitado! Não é à toa que a Igreja Católica vem perdendo adeptos em todo o mundo pela sua prepotência e pelo seu arcaísmo diante das mudanças que “os seres humanos” vêm sofrendo diante da sociedade contemporânea. Só falta agora a ICAR estabelecer que as mulheres no Brasil têm que usar a burqa como ocorre na maioria dos países árabes! Ou adotar normas como ocorre no Irã onde a vida de uma mulher vale a metade que a de um homem, assim como seu testemunho perante um juiz sobre qualquer assunto, e, além disso, elas não podem se divorciar quando quiserem e só podem manter a custódia dos filhos até os sete anos de idade. Ou então, espelhando-se no Taliban, radicalizar de vez sua tentativa de intervir nas questões femininas adotando práticas extremistas através de regras de conduta a serem seguidas como:

1. É absolutamente proibido às mulheres qualquer tipo de trabalho fora de casa, incluindo professoras, médicas, enfermeiras, engenheiras etc.

2.É proibido as mulheres andar nas ruas sem a companhia de um mahram (pai, irmão ou marido).
3.É proibido falar com vendedores homens.
4.É proibido ser tratada por médicos homens.
5.É proibido o estudo em escolas, universidades ou qualquer outra instituição educacional.
6.É obrigado o uso do véu completo (burqa) que cobre a mulher dos pés a cabeça.
7.É permitido chicotear, bater ou agredir verbalmente as mulheres que não estiverem usando as roupas adequadas (burqa) ou que estejam em discordância com o que o Taliban quer, ou ainda que esteja sem o seu maham.
8.É permitido chicotear mulheres em publico se não estiverem com seus calcanhares cobertos.
9.É permitido jogar pedras publicamente em mulheres que tenham tido sexo fora do casamento.
10.É proibido qualquer tipo de maquiagem.
11.É proibido falar ou apertar as mãos de estranhos.
12.É proibido a mulher rir alto.
13.É proibido usar saltos altos que possam produzir sons enquanto andam, já que é proibido a qualquer homem ouvir os passos de uma mulher.
14. É proibido a presença de mulheres em rádios, televisão ou qualquer outro meio de comunicação.
15. As mulheres são proibidas de usar banheiro público.
16. Ônibus públicos são divididos em dois tipos, para homens e mulheres. Os dois não podem viajar em um mesmo ônibus.
17. É completamente proibido assistir filmes, televisão ou vídeo.

Essa lista vai muito além desses 17 itens (ou proibições). Por que a ICAR não faz uma campanha mundial, já que é uma instituição que prega o ecumenismo, para que os direitos fundamentais do ser humano (no caso aqui, das mulheres afegãs) sejam reconhecidos e praticados em países que adotam procedimentos e atitudes que desrespeitam a dignidade e os direitos humanos? Seria mais interessante do que excomungar uma criança que foi estuprada pelo próprio pai! Por outro lado, a ICAR reivindica mais proteção à mulher em casos de espancamento e assassinato através de ações na justiça, passeatas, seminários, conferências, denúncias nos meios de comunicação cobrando ações afirmativas por parte daqueles que ocupam as três esferas do poder no nosso país. São atitudes contraditórias!


A atual Constituição brasileira trata a mulher com mais respeito e dignidade do que a Bíblia e, consequentemente, muitas religiões que se baseiam nesse “livro sagrado”. O Artigo 5º inciso I da nossa carta magna é bastante claro em relação a isso: “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos dessa Constituição”. Isso se chama princípio de igualdade entre homens e mulheres e é uma das maiores conquistas femininas no nosso país. Apesar de que desde 1948, a Declaração Universal dos Direitos do Homem já anunciava um novo olhar sobre o ser humano. Isso fica bem evidente logo no seu Art. 1º “Todos os seres humanos nascem livres em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência e devem agir uns com os outros em espírito de fraternidade”. O Art. 3º diz o seguinte: “Todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e a segurança pessoal.” Já o Art. 4º determina que: “Ninguém será mantido em escravidão ou em servidão; a escravatura e o tráfico de escravos, sob todas as formas, são proibidos.” O Art. 7º diz: “Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual proteção da lei. Todos têm direito a proteção igual contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.”



Comparando essas conquistas que tentam humanizar a relação entre homens e mulheres no mundo com os ensinamentos bíblicos, é evidente que este último não passa de um código de costumes e regras obsoletos que já não atendem mais os interesses e desejos femininos porque está em descompasso com a realidade da mulher do século XXI.

Em 11 de janeiro de 2003, entrou em vigor a Lei nº 10.406 que apresenta o “novo” Código Civil sedimentando um ordenamento jurídico em consonância com a Constituição Federal de 1988, principalmente no que se refere à igualdade entre os sexos no nosso país. Outro instrumento de defesa para proteger a mulher foi a criação da Lei 11.340 de 7 de agosto de 2006, mais conhecida como Lei Maria da Penha que no Art.2º diz “Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social.


Em termos de legislação que defende o direito e a dignidade da mulher, o Brasil deu um salto importante em relação a outros países. Por outro lado, essas leis não conseguem conter a violência contra a mulher! O que seria necessário para reverter essa realidade?
Como colocar o Brasil no topo do desenvolvimento, se a maior parte da sua população não tem os seus direitos constitucionais garantidos e respeitados?
O dia 08 de março presta uma homenagem às operárias inglesas que buscavam direitos iguais em relação aos homens, melhores condições de trabalho, dignidade. Esse fato que marcou a história das mulheres inglesas desencadeou um processo de grandes lutas em todo o mundo pelo reconhecimento da participação feminina no mercado de trabalho e os seus direitos devidamente reconhecidos pelos os homens e pela sociedade. A luta das mulheres pelos seus direitos, dignidade e liberdade não é só delas, mas da humanidade! Só assim construiremos uma sociedade mais igualitária e justa!

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